A ocidentalização da Medicina Tradicional Chinesa trouxe à terapêutica milenar ganhos e perdas que valem ser conhecidos
Os puristas costumam se confrontar com os cientistas mais modernosos, que têm na ponta da língua que o conhecimento deve avançar sempre. Isso para o bem de todos.
A boa causa da Ciência é argumento de peso para os que lidam há algumas décadas com a Medicina Tradicional Chinesa, forte aliada hoje da Medicina convencional do Ocidente. A dedução esbarra em algo evidente: as temidas agulhinhas de acupuntura - a princípio, não tão pequenas e finas como as atuais - certamente nem teriam chance de evoluir das iniciais espinhas de peixe para as flexíveis e super reduzidas de aço inox.
Não é difícil que o embate entre os dois conhecimentos terapêuticos perdure por tempo indefinido. Mesmo porque, os benefícios continuam levando cada vez mais pessoas a buscarem nos recursos da MTC um alívio resolutivo para dores e certos problemas persistentes sem tratamentos eficientes, que têm na acupuntura seu atrativo, apesar do pavor coletivo por agulhas de injeção.
Aliar os dois conhecimentos terapêuticos - ocidentais modernos e orientais tradicionais - para alguns profissionais da área de saúde já não é problema. Ao contrário, muitos vencem preconceitos e comentários críticos dos colegas mais céticos. É o que atesta, por exemplo, a fisioterapeuta e especialista em Medicina Oriental, Vilalba Dourado. Pioneira na cidade em acupuntura, coordena o curso local da Academia Brasileira de Artes e Ciências Orientais (Abaco), uma das quatro especializações existentes no Ceará.
De seu início, em 1978, para cá, muita coisa mudou. Sua larga experiência de 30 anos atuando no setor de queimados do Instituto José Frota, reforçou dentro de sua percepção o valor da visão preventiva da Medicina Oriental.
FIQUE POR DENTRO
Tratamento milenar que merece estudo e cautela
Os registros escritos encontrados sobre China têm cerca de 5 mil anos. Por isso, se acredita que a Medicina Tradicional Chinesa tenha, pelo menos, esse tempo de existência. Nos livros históricos chineses, no entanto, há indicações de que por volta de 8 mil anos este povo já realizava tratamentos com agulhas maiores e mais grossas do que as atuais. Além do que, proibiam a aplicação delas mais profundamente em algumas regiões do corpo (olhos, umbigo, pescoço etc...).
Mesmo se usando agulhas finas e apropriadas, as técnicas chinesas não são de todo inofensivas. Conforme a enfermeira e acupunturista Sheila Bombonato, a literatura médica sobre acupuntura faz indicações de raros acidentes mais recentes com uso das agulhas no Ocidente, que levaram os pacientes ao óbito. Podem parecer insignificantes, mas para ela atesta a importância de o profissional ter uma boa formação e capacitação.
Corrobora as palavras da enfermeira o psiquiatra, homeopata e acupunturista Agamenon Honório. E, mesmo com seu ponto de vista de que somente médicos devem praticar a acupuntura, cita casos de perfuração das meninges (nos pontos da nuca), que desencaderam uma meningite letal e no tórax, que levou o paciente à morte. A acupuntura e demais recursos da MTC é tratamento energético, eficaz nas mãos de profissionais bem preparados.
Amplos recursos
.
A briga entre médicos e não médicos que visa estabelecer legalmente quem deve ou não deter o poder de posse da prática da acupuntura no Brasil é antigo e já se arrasta há bastante tempo.
As alegações de ambos os lados são fundamentadas em alguns dos requisitos essenciais de cada especialidade de saúde. Em essência, os médicos indicam ser um ato cirúrgico (uso de agulhas) que requer um diagnóstico e prescrição de terapêutica que só eles estão aptos científica e legalmente a dar.
Já os demais profissionais da área de saúde (enfermeiros, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, psicólogos, entre outros) que fazem ou fizeram formação e empregam com seus pacientes os recursos da MTC, acreditam que os médicos não são os únicos detentores de tal conhecimento, mesmo porque todos se aprofundaram em anatomia, fisiologia e não somente eles.
Raiz do problema
Essa querela, que ainda pode demorar para ser solucionada no âmbito legal e, para muitos profissionais, refere-se a uma tentativa de reserva de mercado por parte dos médicos, acabou sendo positiva pela variedade de cursos de especialização que vêm surgindo na esfera nacional.
O curso de formação da Associação Brasileira de Acupuntura (Aba), por exemplo, conforme seu coordenador local, o acupunturista Nilson Fernandes, segue a visão da Sociedade Internacional de Acupuntura, que se fundamenta na Escola Européia - já que foi um francês quem recuperou muitas informações da Medicina Tradicional Chinesa, trazendo-as para o Ocidente.
A acupuntura praticada por inúmeros profissionais, salienta Fernandes, não é a tradicional, sendo mais simplificada na relação pontos-sintomas. ´A melhor acupuntura do mundo, hoje, é a de base tradicional, que segue o princípio preventivo da saúde´.
Confirma esse ponto de vista o acupunturista mineiro Flávio Bombonato, formado com grandes mestres orientais e um dos nomes respeitados na cidade no Shiatsu e Medicina Tradicional Chinesa. Ele coordena junto com a esposa, Sheila, enfermeira, mestre em Saúde Pública e acupunturista, o curso de especialização em Terapias Tradicionais Chinesas, com várias turmas concluídas e outra em andamento pela Universidade Estadual do Ceará. A nova turma, com início previsto para este mês, tem a denominação de Formação de Especialista em Acupuntura, com promoção do instituto de ensino do casal, Acus Natus.
´O novo curso é o mesmo da UECE, com outras abordagens complementares, como o shiatsu, a fitoterapia chinesa, a auriculoterapia e a dietética chinesa´, esclarecem os dois.
Ir até a raiz do problema, ou do desequilíbrio, e não se preocupar demais com a manifestação (ou sintoma) segundo Flávio e Sheila Bombonato, está no fundamento da analogia chinesa, que compara o ser a uma árvore. Nutrir bem esta raíz sustenta o ser vivo em seu eixo vital.
´Falamos sempre, na perspectiva chinesa, em termos de padrões sindrômicos, que não são iguais para todo mundo, mas bastante pessoais. Cada indivíduo expressa ou manifesta o desequilíbrio de uma forma bem própria´, atestam.
Somente com o aprendizado, o tempo e a experiência é possível se entender como se proceder no diagnóstico energético, por meio da língua e pulsologia. Apesar de muitos se envolverem e se encantarem com a filosofia da tradição oriental, que segue normalmente a observação da natureza e os eventos, nas estações, o entendimento é bem mais complexo do que se imagina.
Mistificar o sistema
Para o médico psiquiatra Agamenon Honório, a avaliação da língua e do pulso é apenas mais um recurso, não devendo ser exclusivo para o diagnóstico total, pois acaba se mistificando um sistema que deve ser mais científico. Já foram realizadas pesquisas com os próprios mestres chineses, que confirmaram apenas 10% de similaridade nos diagnósticos em um mesmo paciente pelos métodos tradicionais.
A coordenadora do curso da Academia de Artes e Ciências Orientais (Abaco), fisioterapeuta e acupunturista Vilalba Dourado diz que a visão da MTC, deve ser respeitada, sendo distinta da abordagem Ocidental. Aqui se observa o desequilíbrio energético interno, levando em conta as emoções. Conter ou expressar de modo intenso emoções, como a raiva e até a alegria, acarreta distúrbios variados.
ESPECIALIZAÇÕES
Curso de Acupuntura da Associação Brasileira de Acupuntura (Aba). Coordenação Nilson Fernandes. Informações: (85) 4011-0375 e 9444-8868
Curso de Formação de Especialista em Acupuntura do Instituto Acus Natus, coordenado por Flávio e Sheila Bombonato. Informações: (85) 3472-6471 e 3094-4280.
Curso de Especialização da Sociedade Médica Brasileira de Acupuntura. Diretor de Ensino nacional e local: Dr. Agamenon Honório. Informações: (85) 3264-2562 e 9955-9573
Curso da Academia Brasileira de Artes e Ciências Orientais (Abaco). Coordenação Vilalba Dourado. Início em agosto. Informações: (85)3252-4090 ou 8852-4090.